Boas-vindas

Boas-vindas 550 345 Instituto Palavra Aberta

Discurso do professor e conselheiro do Instituto Palavra Aberta, Eugênio Bucci

Começo abrindo aspas: “Tornei-me um arauto da liberdade de expressão e digo que é impensável ter-se a censura pelo Estado, que é uma das piores que pode haver.”

São palavras do Ministro Marco Aurélio Mello. São palavras claras, palavras abertas. Ele as pronunciou no dia 11 de junho, ao proferir seu voto pela não obrigatoriedade de autorização prévia para publicação de biografias. Naquele dia, muitos de nós aqui o aplaudimos em pensamento. Agora, temos a chance de aplaudi-lo mais de perto, ao saudá-lo como nosso novo conselheiro.

Essa frase representa muito bem o comprometimento do ministro com a liberdade em sua carreira de 25 anos no Supremo Tribunal Federal. Com justiça, com toda a justiça, ele foi agora homenageado com uma exposição que marca o seu jubileu de prata, no salão nobre do Supremo, com recordações preciosas de uma trajetória brilhante.

Presidente da Corte no período de 2001 a 2002 e presidente por três vezes do Tribunal Superior Eleitoral, ele é diretamente responsável por avanços de forte carga simbólica que fortalecem o direito fundamental de livre expressão e de seu necessário espelho, o direito de acesso à informação.

Foi ele quem sancionou, quando exerceu interinamente a Presidência da República, em 2002, a lei 10.461 que criou a TV Justiça – que também por ele foi inaugurada também por ele no dia 2 de agosto do mesmo ano de 2002. Medida corajosa, ousada, a TV Justiça acabou sendo reconhecida mesmo por aqueles que a criticavam como um passo que não admite recuo. Graças a ela, o Brasil aprendeu o idioma do Judiciário e, principalmente, os magistrados foram impelidos a aprender a língua do povo, para benefício da Justiça e da democracia.

Também foi o ministro Marco Aurélio quem transferiu a “sala de imprensa” para o prédio principal do Supremo, facilitando o trabalho dos jornalistas que cobrem o Poder Judiciário. Pode parecer uma medida administrativa de rotina, mas não percamos de vista o poder simbólico desse gesto. Num país em que os poderosos, mesmo os que dizem gostar do povo, abominam qualquer proximidade com a imprensa, o ministro abriu portas para melhorar as condições de trabalho dos profissionais encarregados de fiscalizar o poder que ele mesmo exerce.

Ainda ontem, a nossa presidente, Patrícia Blanco, comentava comigo outros pronunciamentos do ministro Marco Aurélio, cuja força moral resistem ao tempo. São pensamentos que devem ser lembrados por nós na data de hoje. Vejamos o que ele afirmou quando estava em julgamento o humor jornalístico e a charge durante o período eleitoral:

“É inimaginável uma censura, quer administrativa, quer normativa, quer jurisdicional à liberdade de expressão.”

Em outra ocasião, quando o antissemitismo estava em pauta, ele declarou:

“Só teremos uma sociedade aberta, tolerante e consciente se as escolhas puderem ser pautadas nas discussões geradas a partir das diferentes opiniões sobre os mesmos fatos.”

Ou, ainda:

“É por meio do direito fundamental da liberdade de expressão que ocorre a participação democrática, a possibilidade de as mais diferentes e inusitadas opiniões serem externadas de forma aberta, sem o receio de, com isso, contrariar-se a opinião do próprio estado ou mesmo a opinião majoritária. É assim que se constrói uma sociedade livre e plural, com diversas correntes de ideias, ideologias, pensamentos e opiniões políticas.”

Que soe uma voz como essa na cúpula do Poder Judiciário do nosso país é uma garantia democrática para os brasileiros. Que a mesma voz, a partir de hoje, venha se integrar ao Conselho Consultivo do nosso Instituto Palavra Aberta, é uma honra para a nossa entidade.

Para nós, a liberdade é ponto de partida, ainda que ela seja, também, ponto de chegada. Na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, ela aparece logo no primeiro artigo: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos”. Depois, em seu artigo final, o 30º, se não me engano, o documento retoma o tema da liberdade: “Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos”.

O adjetivo “livre” é o ponto de partida e o substantivo plural “liberdades” é o ponto de chegada dos Direitos Humanos. Direitos Humanos, portanto, são inseparáveis da Liberdade, porque as duas coisas são uma coisa só. A liberdade não apenas é parte constitutiva dos direitos humanos como deles são, seguramente, o princípio e o fim.

Caro ministro, a sede do nosso Instituto é a planície. Ficamos longe do Estado, longe do poder. Nosso alicerce se assenta na sociedade civil. Do Estado esperamos não apenas que ele se recuse a censurar, que ele se recuse a espionar ilegalmente cidadãos livres. Esperamos mais. Esperamos que o poder não ceda à tentação de querer editar o debate público.

Assim como o Estado só existe quando, a favor dele, os cidadãos renunciam ao uso da força e se recusam a fazer justiça com as próprias mãos – noção que foi tão bem demonstrada por Weber, que partiu de uma declaração de Trotsky (“Todo Estado se funda na força.”), na célebre conferência “A política como vocação” –, nós intuímos que a democracia só existe quando o Estado não se permite interferir sobre a formação, a manifestação e o trânsito das opiniões e da vontade dos cidadãos.

Essas duas renúncias, se é que podemos chamá-las assim, são essenciais uma à outra. São espelhadas e são reciprocamente indispensáveis. Aceitar que o Estado possa editar o debate público equivale a admitir, no limite, que o pensamento se resolve com base na força. Se o Estado tem o monopólio da violência legítima, a sociedade civil precisa ter o monopólio da opinião e da vontade.

A isso damos o nome, também, de Estado de Direito. Ou, ainda, damos o nome de liberdade. Só assim pode existir a palavra aberta.

Bem-vindo, conselheiro Marco Aurélio.

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Discurso de Patricia Blanco, presidente do Instituto Palavra Aberta

Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio Mello
Senhoras e Senhores,

É uma grande alegria recebê-los aqui, hoje, para comemorar uma data muito especial, os 5 anos do Palavra Aberta. Alegria maior recebê-los para dar posse ao Ministro Marco Aurélio Mello como membro do Conselho Consultivo do nosso Instituto.

Criado em 2010 com o objetivo de defender e promover a liberdade de expressão em nosso País, o papel do Palavra Aberta se torna a cada dia mais importante e relevante na busca pelo pleno alcance dos seus objetivos. Nestes 5 anos tivemos muitas conquistas importantes. Posso citar algumas delas, como, por exemplo, a promulgação da Lei de Acesso à Informação Pública, que contribuiu para dar transparência às ações do poder público em todas das suas esferas.

Comemoramos os 25 anos da Constituição Brasileira com uma exposição no corredor de acesso ao plenário que lembrou a sua importância na consolidação da democracia e da liberdade. Não foi à toa que a Constituição ficou conhecida como a “Carta da liberdade”. E claro, não poderia deixar de citar a decisão histórica do Supremo Tribunal Federal, que, por unanimidade, deu vitória à liberdade de expressão, expulsando de vez a censura prévia do espaço democrático.

Foi com a citação de uma cantiga de roda que a Ministra Cármem Lúcia resumiu o seu voto: “Cala boca já morreu, é a Constituição do Brasil que garante”. O próprio Ministro Marco Aurélio Mello reconheceu a importância do tema ao dizer: “O Supremo julga hoje se o Brasil tem idade para escrever a sua própria história”.

Podemos afirmar que nunca tivemos tanta liberdade!

Mas nem só de vitórias vivemos estes 5 anos. Tenho dito que a defesa da liberdade de expressão é uma luta cotidiana, árdua e que tem que ser renovada diariamente.

Surgem a cada dia novos desafios, novas formas de tentar tolher a imprensa livre, a livre circulação de ideias, a possibilidade de comunicar produtos e serviços, além de novas formas de censura que se apresentam de forma sutil e procurando se impor por outros meios.

As novas faces da censura se apresentam de diversas maneiras, seja via censura judicial, que impede veículos de publicar matérias, seja pela tentativa de criar regras que restrinjam a liberdade de informar ou propiciar o livre acesso a informações relevantes para a sociedade. Sem contar o crescimento das ameaças à jornalistas e veículos de comunicação, que muitas vezes são impedidos de trabalhar ou de cobrir fatos que interessam para toda a população.

Soma-se, por outro lado, do adensamento da cultura da intolerância e do politicamente correto. Basta olhar rapidamente as mídias sociais, por exemplo, para se constatar que a discussão política ou de comportamentos passa a ser de extremos, delimitando-se apenas a dois campos: contra ou a favor, numa verdadeira briga de torcidas, que muitas vezes ultrapassam o digital. O caso mais recente foi a ameaça sofrida por Jô Soares.

Temos acompanhado também um aumento no número de iniciativas que, revestidas de boas intenções, se aprovadas, se revelarão num grande retrocesso ao direito inalienável à liberdade de expressão.

Essas ações, se vierem a ser confirmadas, impactarão não só setores importantes da economia ou da mídia, mas impactaram principalmente, a sociedade e o sistema democrático em que vivemos.

É somente a partir de instituições sólidas e da imprensa livre, independente e forte, que poderemos garantir a democracia em nosso País.

Por isso, gostaria de fazer um convite a todos vocês, juntem-se a nós:
• Sejam promotores da nossa causa,
• Tornem-se apoiadores da livre iniciativa,
• Defensores da imprensa livre,
• Ativistas da liberdade de expressão e, principalmente,
• Guardiões da democracia.

E nas palavras do Ministro Marco Aurélio Mello, que tanto nos honra com sua presença no Conselho do Palavra Aberta, se tornem, como ele, um arauto da liberdade.

E para dar posse ao Ministro, convido o nosso conselheiro consultivo Eugênio Bucci, para fazer uma saudação especial em nome dos demais membros: Roberto Muylaert, Marcelo Moscogliato, Fernando Schüler, Ricardo Gandour e Cristiano Câmara, e os que não puderam estar presentes: Mônica Waldvogel, Lívia Barbosa, Sergio Fausto e o Ministro Carlos Ayres Britto.

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