A poucos meses das eleições, máquina de desinformação está mais sofisticada

A poucos meses das eleições, máquina de desinformação está mais sofisticada 682 1024 Instituto Palavra Aberta

📸: Gustavo Lima/STJ

Apesar dos esforços da imprensa e de diversas instituições, o Brasil está ameaçado de ver nas eleições gerais deste ano uma profusão de desinformação a exemplo do que ocorreu no pleito de 2018. A avaliação é da jornalista Ana Cristina Rosa, que comandava a comunicação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) há quatro anos. “Os mecanismos da máquina de desinformação parecem ter se sofisticado bastante nos últimos quatro anos “, diz a jornalista, colunista de opinião da Folha de S.Paulo, assessora-chefe de comunicação do Conselho da Justiça Federal (CJF), coordenadora da Associação Brasileira de Comunicação Pública (ABCPÚBLICA) – seção Distrito Federal e membro do Conselho Consultivo do Instituto Palavra Aberta. Confira abaixo a íntegra da entrevista com ela.

Palavra Aberta – As eleições deste ano podem repetir a avalanche de desinformação em massa vista no pleito de 2018?
Ana Cristina Rosa – Em que pesem os esforços da imprensa e de diversas instituições – públicas e privadas –, acredito que o pleito deste ano pode sim repetir a avalanche de desinformação que vivemos nas eleições gerais de 2018. Até porque, os mecanismos da máquina de desinformação parecem ter se sofisticado bastante nos últimos quatro anos. Se antes tínhamos fazendas de robôs, agora temos também ‘bots humanos’ trabalhando em fazendas de cliques por menos de centavo de real com a finalidade de aumentar a relevância, ou melhor, a influência de determinados perfis que são alimentados com todo tipo de conteúdo. E ainda não há um modelo de regulamentação das redes sociais, que comprovadamente já se mostraram capazes de ameaçar o mundo real por meio de sua arquitetura de disseminação de informação. Ou seja, podem – e muitas vezes de fato foram e são – usadas como canais de reprodução e disseminação de mentiras, informações tendenciosas e versões distorcidas. Soma-se a isso o fato de que não houve nesse período um investimento maciço em educação midiática, o que faz com que, num país com mais de 11 milhões de analfabetos entre os maiores de 15 anos como é o Brasil, a população em geral siga sem saber distinguir fato de opinião.

Em relação ao combate à desinformação, quais são os principais avanços que temos nas eleições deste ano?
Ana Cristina Rosa – Em 2018, o Estado estava desprevenido para os ataques institucionais. As instituições foram pegas de surpresa. Em 2022 essa realidade mudou. Instituições públicas e privadas, todas estão cientes e em alerta para a gravidade que a desinformação representa para uma sociedade democrática. Do ponto de vista institucional, a Justiça Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal fortaleceram suas parcerias com a sociedade para enfrentar essa situação por meio de ações que integram as plataformas de redes sociais, universidades, startups, entidades de classe e organizações da sociedade civil. Também serão promovidas pesquisas e projetos relacionados ao combate às fake news voltados às comunidades. O Congresso Nacional tem dado sinais claros de confiabilidade no sistema eleitoral brasileiro, que é dos mais modernos, seguros e eficientes do mundo. Me parece também que a campanha publicitária da justiça eleitoral na TV divulgando o número do celular do BOT que esclarece dúvidas sobre as eleições pode ajudar bastante a esclarecer dúvidas sobre o processo eleitoral. Além disso, o TSE fixou entendimentos importantes que devem refletir nas eleições de 2022. Um exemplo é o fato de o tribunal ter passado a considerar de forma explícita que as redes sociais e os programas de mensagem, se usados de forma indevida, podem levar à cassação. Essa é uma mudança muito relevante, porque até então havia a dúvida se os meios de comunicação social são só aqueles meios de concessão pública, como rádios e TVs. Agora, para as próximas eleições, essa dúvida não existe mais.

O que as pessoas devem fazer para evitar as notícias falsas e o discurso de ódio no período eleitoral?
Ana Cristina Rosa – A melhor arma contra a mentira é a verdade. Então o que as pessoas devem fazer é buscar informação em fontes oficiais e qualificadas. Procurar os sites dos partidos políticos, do Tribunal Superior Eleitoral, portais de empresas profissionais de notícia e tentar conferir se aquela informação é procedente. Não acreditar em toda e qualquer mensagem recebida por aplicativo ou rede social é crucial. Em termos de desinformação, a desconfiança é fundamental (rsrsrs).

Há hoje uma grande discussão sobre os limites da liberdade de expressão. Você acha que pode haver um recuo nas liberdades por causa da maior vigilância à desinformação nas eleições?
Ana Cristina Rosa – Entendo que a liberdade de expressão é um direito absoluto e compreende, além do direito de informar, o direito ao acesso à informação e o direito à opinião. Isso é inegociável. Mas precisa se dar em respeito às demais garantias constitucionais, especialmente aos chamados direitos da personalidade, como a intimidade, imagem, honra. É preciso ter ética, senso crítico e responsabilidade para exercer plenamente a liberdade de expressão. Em nome da liberdade de expressão, não é possível defender discurso de ódio, racismo, homofobia, falas que além de desrespeitosas, atentam contra direitos fundamentais e configuram crimes. Fenômenos recentes de mudanças de posição eleitoral como a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, ou o Brexit no Reino Unido, tiveram seus resultados profundamente alterados pela exploração das redes sociais com a disseminação de fake News.

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