Caminhos da liberdade de expressão

Caminhos da liberdade de expressão 630 345 Instituto Palavra Aberta

* Patricia Blanco

Três tendências ganham traços firmes, hoje, quanto ao futuro da liberdade de expressão. A primeira se relaciona a países como Rússia e China, que controlam a mídia e a liberdade de expressão e de imprensa são consideradas uma forma de dissidência.

Também participam desse ranking Síria, Líbia e Egito, onde jornalistas correm mais perigo do que antes da chamada primavera árabe. A segunda é fruto do narcotráfico e ainda dos jihadistas que se consideram ofendidos pelo noticiário da mídia. O México é um exemplo típico da força do tráficantes de drogas e a França, que sofreu graves atentados terroristas, uma prova do que significa a insurreição da fé. E, por fim, há aquela tendência que associa o controle da mídia à segurança nacional e envolve até mesmo países de tradição largamente liberal, tais como França e Estados Unidos, e é explicada pela proteção contra o terrorismo.

Esse é o quadro, traçado em suas grandes linhas, pela revista The Economist, edição de 4 de junho de 2016 (matéria publicada na íntegra no site do Palavra Aberta). Na realidade, não parece poupar nada, incluindo as mídias sociais e países da Europa como a Alemanha, também presidida pelo espírito liberal. Há um sentimento de medo no ar e, com ele, de intolerância para com a liberdade, acusada, muitas vezes, de ser responsável por problemas contemporâneos como a pornografia, infantil inclusive; a violência contra a mulher; a excitação à violência e a discriminação. Ficam as questões: esses anacronismos desaparecerão se houver restrições à liberdade ou precisam da liberdade para serem discutidos, enfrentados e superados? É evidente que quanto mais a sociedade for aberta, mais fácil será lidar com os problemas e contorná-los.

Mas há uma outra questão que diz respeito especificamente ao Brasil. Como ficará a liberdade no País nesse ambiente adverso? O Brasil é um país onde a liberdade de expressão, como nos Estados Unidos, é assegurada pela Constituição. É cláusula pétrea e tem funcionado como oxigênio da democracia desde 1988. Tem resistido às adversidades. Desde as sucessivas denúncias de corrupção à violência que grassa no País, atingido a todos, desde as crises políticas às manifestações da cidadania, envolvendo as diferentes colorações políticas. Nada se ajusta mais à construção de uma democracia de massas do que a liberdade de expressão e de imprensa. Daí, a necessidade de resistir, de aprofundá-la, de fazer valer a Carta Magna.

O que aconteceria se não existisse o discurso que se alinha com o compromisso de “respeitar as diferenças”, que prega “tolerância”, “diálogo”, “cuidado com o outro”, “direito das minorias”…? Favoreceríamos ao ódio, a intolerância, a ausência de respeito à liberdade de escolha do outro. Seria a volta da ditadura, da censura… Um retrocesso inadmissível. Nada no Brasil dos dias atuais aponta nessa direção. Mas não podemos esquecer que a luta pela liberdade de expressão e de imprensa é diária. Uma construção sem fim, mesmo quando há garantia da Constituição e toda uma geração que cresceu e se acostumou com a liberdade como sendo algo tão natural como o ar que se respira.

Continuemos, pois, cultivando as liberdades públicas. A democracia promete participação na construção coletiva de um mundo mais justo, mais livre, mais humanizado e de igualdade de oportunidades. Tem sido assim. A construção é um processo que pode ser lento e conflitante, mas avança. Sem liberdade, seria um retrocesso. E nos atrasamos por causa dos frequentes retrocessos. Basta verificar a história. Fomos obrigados a recomeçar várias vezes.

As tendências apontadas pela prestigiosa The Economist são conjunturais. A liberdade de expressão tende a se afirmar no curso do tempo. Nesse sentido, apesar de todas as dificuldades, o Brasil tem caminhado na mesma via da história. Tem graves problemas, mas tem procurado resolvê-los sem prejuízo da liberdade. Olha para frente e com isso, está criando uma cultura de liberdade.

* Patricia Blanco é presidente do Instituto Palavra Aberta

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