Fortalecer a diversidade é fortalecer a democracia

Fortalecer a diversidade é fortalecer a democracia 1024 683 Instituto Palavra Aberta
Patricia Blanco*

Imagem: Vlad Tchompalov | Unsplash

Ataques a instituições, corrupção, redução de direitos civis, crimes de ódio e desinformação são ingredientes de uma tóxica mistura que está causando cisão social e fragilizando as democracias em diferentes partes do mundo. A 13ª edição do Índice de Democracia (Democracy Index), organizado pela The Economist Intelligence Unit, que mede o grau de democracia nos países, revelou que a pontuação global média caiu de 5,44 em 2019 para 5,37 em 2020, o pior resultado desde 2006, ano em que o índice passou a ser calculado. Já o relatório Variações da Democracia (V-Dem), do instituto de mesmo nome ligado à Universidade de Gotemburgo, na Suécia, indica que o percentual da população mundial que vive sob regimes considerados não democráticos subiu de 48% em 2010 para 68% no ano passado.

Esse quadro assustador, entretanto, vem acompanhado de intenso debate sobre a necessidade de manter os valores democráticos, vistos como fundamentais pelas maiorias nos países livres. É o caso do Brasil, onde, de acordo com pesquisa Datafolha, 75% dos entrevistados consideram a democracia o regime mais indicado, o que gera otimismo entre os democratas.

“Fortalecer a democracia também significa abraçar a participação genuína na tomada de decisões (…), dando uma voz real às pessoas e comunidades que tradicionalmente foram excluídas”, diz mensagem do secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, alusiva ao Dia Internacional da Democracia, comemorado em 15 de setembro. “O silenciamento de mulheres, minorias religiosas e étnicas, comunidades indígenas, pessoas com deficiência, defensores dos direitos humanos e jornalistas é um impedimento para a criação de sociedades saudáveis. A democracia simplesmente não pode sobreviver, muito menos florescer, na ausência de espaço cívico”, completa Guterres.

Diversidade e pluralidade são princípios democráticos diretamente associados a outro fundamento da democracia: a liberdade de expressão. Juntos, esses conceitos são catalisadores de necessárias transformações para a construção de sociedades mais justas e equânimes, tarefa que no Brasil é inadiável diante da dimensão das desigualdades e da profusão dos discursos de ódio de todos os tipos – racismo, misoginia e homofobia, entre outros preconceitos. E o trabalho deve começar dentro das escolas, com o apoio fundamental de organizações da sociedade civil, sobretudo agora em que a pandemia agravou ainda mais a desigualdade social.

No caso do ambiente escolar, a educação midiática é hoje prática decisiva para que crianças e jovens participem do ambiente midiático com responsabilidade, ajudando no combate a preconceitos. Se é no ambiente virtual que se concentra a fúria discriminatória contra mulheres, negros, indígenas e LGBTQIA+, é também nesse espaço que estão dispostos o conhecimento e os melhores caminhos de combate à intolerância e a discriminação.

Os estudantes têm o direito de saber o quanto a desigualdade é nociva no Brasil. Para estarem dispostos a promover mudanças, os alunos precisam ter acesso a informações e saber interpretá-las de forma crítica como, por exemplo, no caso das informações que mostram que as mulheres, em geral, ganham salários 30% inferiores aos dos homens. Os dados são de um estudo de Laísa Rachter, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), que também revela avanços que precisam ser de conhecimento dos jovens. Um deles é o fato de as mulheres representarem atualmente 54% da força de trabalho mais qualificada. 

Crianças e adolescentes também precisam saber que negros e pardos, cerca de 55% da população brasileira, representaram 77% das vítimas de assassinato no país em 2019, segundo o Atlas da Violência 2021. Por outro lado, é fundamental conhecer dados positivos, pois eles revelam que a transformação social é possível. É o caso do número de matrículas de estudantes negros e pardos nas universidades e faculdades públicas no Brasil que, em 2018, ultrapassou, pela primeira vez, o de brancos. 

A representatividade, em todas as esferas, não é apenas um componente de reflexo da sociedade nem somente uma boa medida para os negócios. Garantir a diversidade e a pluralidade nas sociedades, permitindo a participação de todos nos grandes debates, é um pressuposto da democracia e do exercício pleno da liberdade de expressão. 

Em um ambiente democrático, é preciso saber ouvir, opinar com responsabilidade e, com isso, estabelecer, a partir de discordâncias, o consenso. Nesse contexto, em que é possível pactuar metas e estabelecer objetivos que visam o progresso e o bem-estar de todos, a democracia se fortalece e se realiza em sua plenitude. 

No momento atual vivido no Brasil, comemorar o Dia Internacional da Democracia se faz ainda mais necessário e pertinente. Permite reafirmar seus conceitos e refletir sobre o papel de cada um de nós na preservação dos seus princípios. 

 

*Patricia Blanco é presidente do Instituto Palavra Aberta

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