Lava Jato e liberdade de expressão

Lava Jato e liberdade de expressão 630 390 Instituto Palavra Aberta

*Patricia Blanco

O segredo dos processos da Operação Lava Jato é não ter segredo nenhum. Foi o que ressaltou o juiz Sérgio Moro, no encerramento do IX Fórum ANER de Revistas, ocorrido recentemente em São Paulo. A claridade da liberdade de expressão e de imprensa rege a divulgação de tudo que acontece nos processos, sobretudo naquilo que se relaciona com a corrupção.

Não há mistérios, portanto, nesse trabalho delicado, iniciado em março de 2014, e que envolve a prisão de crescente número de empresários, executivos e, também, de políticos, com larga repercussão junto à opinião pública.

A ideia é que seus procedimentos se tornem corriqueiros, não exceção, como fez questão de assinalar Moro: “Não há sigilo de informações. Por investigar crimes contra a administração pública, os processos das diferentes fases da Lava Jata são públicos. E quem decide pela prática dessa característica, não é o juiz, e, sim, a Constituição. Na realidade, cumpre-se a lei. Nada mais.” Moro foi didático ao falar do tema, tão ruidoso quanto original em meio às nossas práticas jurídicas. E, para ilustrar, falou amplamente do Artigo V da Constituição que trata justamente do direito do cidadão à informação.

Segundo o juiz federal, o que caracteriza a Lava Jato é a transparência, palavra complexa que pode ser traduzida como ausência de segredo ou do secreto. Certamente por essa razão é que surpreende. Não se subestima a sociedade. O cidadão sabe julgar os fatos, avaliá-los, e busca discernir o que é verdade e o que não é em meio à massa de informações que recebe diariamente. Daí os processos terem se sucedido na época das eleições. E por que não? “O juiz tem compromissos com os fatos, as provas e a lei. São esses os princípios que dão alicerce às investigações e sua divulgação sem censuras”, explicou Sérgio Moro. Longe de esconder, a Lava Jato vira as costas para a obscuridade dos bastidores, seja da política, das administrações ou de pessoas envolvidas, sem dúvida pessoas relevantes na sociedade.

Na sua palestra, Moro falou ainda das contribuições que o jornalismo investigativo vem dando às investigações. Por ter pauta mais flexível, às vezes descobre antes fatos que a polícia só irá confirmar posteriormente. É natural. Faz parte do jogo democrático. Moro foi aplaudido de pé, longamente. No livro O declínio do homem público, o autor Richard Sennett lembra que uma natureza humana que transcendente, cujo caráter se afirmaria pelas experiências da vida, precisa ser substituída pela renovação do interesse político, com ênfase ao bem público. Pois o que a prática revela é que essa “natureza transcendente” não existe e, caso existente, resvala para o âmbito dos personalismos e da desatenção com a coisa pública.

O propósito seria uma “retribalização” social. Não mais as iniquidades de um declínio que se esgota na inconsistência, mas o despertar das possibilidades éticas e civilizadas que se encontram adormecidas. A transparência de que trata a Constituição e a qual Moro se referiu no evento da ANER é pilar central das possibilidades de renovação da vida social brasileira. Não é um falso otimismo, mas um otimismo nascido das relações sociais que se aperfeiçoam em ambiente de liberdade. Daí a expectativa estar voltada para o que virá depois da Operação Lava Jato. O País irá se renovar? Essa é a expectativa que se amplia todas as vezes que a esperança de liberdade vence o arcaico culto ao segredo.

* Patricia Blanco é presidente do Instituto Palavra Aberta

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