Restrições à publicidade nos meios de comunicação

Restrições à publicidade nos meios de comunicação 550 345 Instituto Palavra Aberta

Edney-Narchi-_-Foto-Divulgacao* Edney Narchi

No sentido de que continuamos, diuturnamente, cumprindo nossa missão institucional de defender a liberdade de expressão comercial e zelar pela ética publicitária quero começar pelo mais importante:

Constituição Federal – Capítulo V – da Comunicação Social. Artigo 220: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§3º – Compete à lei federal:

II- Estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.

§4º – A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso.”

Esse é o ordenamento constitucional que delimita a possibilidade do estabelecimento de restrições à comunicação mercadológica. A regra geral é a da liberdade de expressão, inclusive a comercial. Tal liberdade, dentro da lei maior, comporta limites, não é absoluta. Pode ser limitada, por exemplo, como medida de proteção à saúde e ao meio ambiente e para disciplinar a propaganda de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias. É limitada, peremptoriamente, pela legislação consumerista, que reprova a publicidade enganosa e a publicidade abusiva.

Mas, atenção: tais restrições e disciplinas, porém, dependem de leis. E leis federais, porque a mesma Constituição, em seu art. 22, inciso XXIX comanda que “Compete, privativamente, à União legislar sobre propaganda comercial”.

Quando a Constituição diz “Compete à União” a confiabilidade oficial será atribuída ao somatório de Poder Executivo mais Poder Legislativo. Vale dizer, se exercerá mediante leis aprovadas no Parlamento e sancionadas pela presidência da República ou após medida provisória regularmente convertida em lei ordinária pelo Congresso Nacional.

Assim sendo, leis estaduais ou municipais, resoluções de agências reguladoras, resoluções de conselhos federais, entre outros, não podem estabelecer validamente obrigações novas, proibições, regramentos de cumprimento geral e obrigatório em face da propaganda comercial; qualquer que seja sua motivação.

Reiteradas decisões de tribunais, aposições de vetos de governadores e prefeitos a esdrúxulas leis de respectivas assembleias e câmaras municipais, ilustrados pareceres da Advocacia Geral da União confirmam tal entendimento: apenas leis federais podem criar obrigações para a propaganda comercial.

Não é por outro motivo que já antigas decisões da Anvisa, procurando restringir publicidade de medicamentos e alimentos, foram revogadas pelos tribunais superiores. Da mesma forma, mais recente deliberação do Conanda, a respeito de publicidade infantil, caiu no vazio. Nenhum desses atos constituía lei federal – votada pela Câmara dos Deputados, Senado e sancionada pela presidência da República.

E o que o nosso Congresso Nacional discute, neste momento, a respeito de restrições à publicidade nos meios de comunicação? Muita coisa. Apesar de sabermos que a publicidade brasileira é de ótima qualidade – técnica e eticamente – e que a sociedade brasileira, como demonstrado em seguidos levantamentos realizados pelo Senacom do Ministério da Justiça, não está a reclamar providencias legais contra a liberdade de expressão comercial, pois as queixas fundamentadas levadas pela população a seus respectivos Procons, são praticamente inexpressivas do ponto de visa estatístico.

Tramitam hoje pelas casas do Congresso, 236 proposições que tratam de restringir a publicidade de inúmeros produtos e categorias: publicidade infantil (11 projetos), alimentos (17 projetos), bebidas alcoólicas (13 projetos), medicamentos (18 projetos), uso de letras miúdas/ressalvas (17 projetos), propostas de modificações na classificação indicativa (36 projetos), etc.

Alguns em estágio mais evoluído, outros nem tanto, mas todos demandando a atenção dos setores envolvidos, acompanhamento, participação em audiências públicas e debates. Há proposições em trâmite por longo período: 18 anos, 16 anos, 15 anos, 14 anos…

Digo que devemos continuar confiando no Congresso Nacional, único fôro de onde pode sair validamente alguma restrição à publicidade nos meios de comunicação, pois o conjunto de nossos representantes, peremptória e reiteradamente, não vê com simpatia qualquer atitude censória.

Além de receberem democraticamente as entidades interessadas, os próprios deputados federais brasileiros criaram a Frente Parlamentar de Comunicação – FreCom, cujo fundador e primeiro coordenador é o ilustre deputado Milton Monti, ativista nas comissões permanentes e no plenário defendendo a liberdade de expressão comercial.

Em se tratando de autorregulamentação publicitária, o rádio e a televisão foram decisivos para a vitoriosa implantação do mecanismo da disciplina voluntária da propaganda comercial. A Abert é uma das entidades fundadoras do Conar e, representando as mídias para as quais se dirige o maior investimento publicitário em nosso País, temos certo que o apoio da radiodifusão à autorregulamentação não é apenas decisivo, mas indispensável. Nada menos que 126 empresas e entidades de radiodifusão são filiadas ao Conar, sustentando moral e materialmente as atividades do controle ético exercido no aprimoramento da propaganda brasileira.

A autorregulamentação dispõe sobre restrições à publicidade? Sim. Em conjunto com as leis federais aplicáveis, é responsável por constituir o sistema misto de controle que delimita, constitucionalmente, a liberdade de expressão comercial, fazendo-o, acima de tudo, da forma mais democrática possível.

Todas as normas do Código de Autorregulamentação são adotadas após consultas a anunciantes, agências de publicidade e veículos de comunicação; portanto, atendendo aos legítimos interesses de quem pratica a comunicação mercadológica profissionalmente, sem olvidar os relevantes direitos dos consumidores, destinatários finais da atividade publicitária, é da confiança do consumidor na publicidade que deve prosperar toda atividade de comunicação mercadológica.

O Código de Autorregulamentação trata de princípios que os anúncios e campanhas devem observar sobre respeitabilidade, decência, honestidade, medo, superstição, violência, apresentação verdadeira, identificação publicitária, propaganda comparativa, segurança e acidentes, proteção da intimidade, poluição e ecologia, crianças e jovens, direito autoral e plágio. Além desses princípios gerais, o Código aborda pontualmente categorias especiais de anúncios, a saber: bebidas alcoólicas, educação, cursos e ensino, empregos e oportunidades, imóveis, investimentos, lojas e varejo, serviços médicos, alimentos e refrigerantes, produtos farmacêuticos, produtos de fumo, inibidores de fumo, profissionais liberais, reembolso postal ou vendas pelo Correio, turismo, viagens e excursões, veículos motorizados, testemunhais, defensivos agrícolas, armas de fogo e apelos de sustentabilidade.

Voluntariamente, portanto, os players da publicidade se afastaram das patologias da comunicação mercadológica que são a enganosidade e a abusividade (definidos, 10 anos depois da introdução da Autorregulamentação, pelo Código de Defesa do Consumidor – lei federal) e ainda estabeleceram normas éticas de conduta para a aplicação de técnicas como a propaganda comparativa, testemunhais, atestados e endossos, teasers e merchandising, entre outros.

Comparando o teor das proposições legislativas em curso com os dispositivos do Código de Autorregulamentação Publicitária, não há uma omissão sequer em nosso ordenamento que justifique a necessidade de lei nova para restringir a publicidade. Existe, porém, muito preconceito ou desinformação para motivar tantos projetos de lei.

Só se admite publicidade de produtos e serviços lícitos, submetidos ao licenciamento pela autoridade pública e por ela aprovados. É axiomático para nós que todo produto ou serviço – comercializado ou prestado debaixo do império da lei – merece um discurso publicitário. Isto vem ao encontro do próprio Código de Defesa do Consumidor que, ao definir os direitos básicos do consumidor, relaciona a “informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços…” Aí está: a publicidade não é apenas um direito do fornecedor em divulgar aquilo que coloca à disposição da sociedade. É também um direito do consumidor. Assim, restrições radicais infringem prerrogativas do mercado e da clientela.

O Conar recebe manifestações dos consumidores sempre que eles se indisponham contra qualquer anúncio. Há alguns anos, o número de processos instaurados para averiguação do comportamento ético da mensagem, denunciados pela população, é o maior contingente de casos processados, em comparação com as demais fontes de abertura de representações. E o Conar continua a estimular os brasileiros a trazerem suas insatisfações em relação à publicidade: o reclamante não paga nada, pode se manifestar por um prático e-mail e dar início à tramitação de um processo, que será rapidamente decidido, assegurando-se a oportunidade de defesa ao anunciante e a sua agência.

Até este mês de agosto, o Conar já processou mais de 8.800 representações éticas para verificar o cumprimento do Código de Autorregulamentação tendo todos os resultados alcançados sido cumpridos. Poucos anunciantes que tiveram seus anúncios reprovados (contam-se pelos dedos das mãos) recorreram ao Judiciário alegando alguma razão – o mais das vezes o fato de não serem associados do Conar e, portanto, não estarem obrigados a cumprir decisões de uma instituição privada. Foram todos vencidos, tendo a Justiça brasileira reconhecido a validade e a conveniência de existir uma disciplina voluntária, abraçada por anunciantes, agências de publicidade e veículos de comunicação, que acaba por exercer um controle moral, elevando os padrões da publicidade disponibilizada entre nós.

Por fim, é necessário destacar, que vários prejuízos advêm das proibições e banimentos de categorias de publicidade: aos anunciantes, que deixam de divulgar seus produtos, serviços e marcas; às agências de publicidade, que perdem o atendimento a setores inteiros da economia; e aos consumidores, que param de receber informações esclarecedoras para suas opções de compra. Acima de todos, estão os veículos de comunicação, financiados pela propaganda comercial que divulgam, obtendo recursos para sua atividade primordial de comunicação social – noticiário, reportagens, entretenimento e opinião – que levam à nação, exercendo insubstituível papel para a manutenção e alargamento da democracia com que todos ansiamos e, desde 1988, reconquistamos.

* Edney G. Narchi é vice-presidente executivo do Conar. Formado em Direito pela Universidade de São Paulo, trabalha no Conar desde 1985, tendo ocupado anteriormente a chefia do Gabinete da Secretaria de Negócios Jurídicos da Prefeitura de São Paulo e a diretoria da Assessoria de Relações Governamentais da Federação do Comércio do Estado de São Paulo.

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