Quase metade dos alunos brasileiros se distrai com celular em aula
Quase metade dos alunos brasileiros se distrai com celular em aula https://www.palavraaberta.org.br/v3/images/Foto-de-RDNE-Stock-project-1024x683.jpg 1024 683 Instituto Palavra Aberta https://www.palavraaberta.org.br/v3/images/Foto-de-RDNE-Stock-project-1024x683.jpg* Mariana Mandelli é coordenadora de comunicação do Instituto Palavra Aberta
Quase metade dos estudantes brasileiros afirma se distrair com celulares durante as aulas. Segundo o mais recente Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), divulgado no início de dezembro, a porcentagem do Brasil (45,1%) é superior à média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade que aplica o exame a cada três anos: 30,5%. Estes dados ganharam as manchetes nos últimos dias e reforçam a discussão sobre a diferença entre a utilização irrestrita e o uso intencional e pedagógico desses aparelhos no ambiente escolar.
Os números do Pisa se referem especificamente a estudantes de 15 anos e a aulas de matemática. O relatório aponta que o uso dessas tecnologias em classe atrapalha inclusive aqueles que não as estão utilizando: cerca de 40% dos alunos brasileiros perdem a atenção quando os colegas estão mexendo no celular. Mais uma vez, a taxa é maior do que a dos países da OCDE, que apresentam média de 25%. Os dados também mostram que quase um terço (30,4%) dos nossos adolescentes nunca desliga as notificações de aplicativos e redes sociais durante o período que estão em aula —a média das economias que compõem a OCDE é de 25,2%.
No entanto, o próprio relatório afirma que a relação entre o “uso moderado” de gadgets e aprendizagem não é “intrinsecamente prejudicial”, pois alunos que gastam até uma hora por dia em dispositivos digitais realizando atividades curriculares obtiveram 14 pontos a mais em matemática do que aqueles que não dedicaram nenhum tempo. Segundo o Pisa, mesmo observando o perfil socioeconômico dos discentes e das unidades de ensino, essa relação ainda é positiva em mais da metade dos países que participaram da avaliação.
Ou seja, a questão está em como se utiliza esses dispositivos —na qualificação desse uso em prol de objetivos pedagógicos, em momentos específicos e com mediação e educação midiática. A criação de diretrizes mais claras e objetivas sobre a utilização dessas tecnologias no ambiente escolar, como demanda a OCDE, está diretamente relacionada, portanto, à preparação das redes de ensino para isso, o que não depende apenas de solucionar questões estruturais no acesso desigual às tecnologias, mas de formar professores e demais educadores para isso.
A simples compra e distribuição de equipamentos e mídias por secretarias de ensino não resulta automaticamente no desenvolvimento de habilidades e competências por parte do público discente. A ponte entre eles é justamente o professor, que precisa estar apto a adentrar esse universo de forma eficaz também como cidadão no mundo digital. Como preparar as novas gerações sem estar devidamente preparado para isso?
São inúmeras as pesquisas que mostram a distância entre a formação inicial docente e a realidade da sala de aula no Brasil, distância esta que a digitalização da vida social pode aprofundar de forma irreversível, já que estamos passando por transformações tecnológicas em uma velocidade jamais vista. As notícias (algumas assustadoras) sobre o progresso da inteligência artificial são apenas um exemplo desse processo.
Isso não significa, é claro, permitir o uso de telefones e demais gadgets de forma irrestrita nas escolas. Mas a discussão sobre a liberação ou o veto de celulares dentro delas não pode estar desassociada de uma visão crítica do uso desses aparatos tecnológicos, especialmente por parte dos educadores. Se os aparelhos eletrônicos forem relegados ao status de inimigos da aprendizagem, como os jovens saberão usá-los de forma ética e responsável?
Isolar a escola do debate sobre os benefícios e malefícios das novas tecnologias é uma forma de privar crianças e jovens de desenvolverem as habilidades e competências necessárias para uma vida autônoma em um mundo onde praticamente todas as nossas relações digitalizaram-se. Qualificar e mediar o uso é uma forma de protegê-los e formá-los para que saibam ser cidadãos no mundo conectado.