Com sonho de virar influenciador, crianças apelam até para Papai Noel

Com sonho de virar influenciador, crianças apelam até para Papai Noel 1024 683 Instituto Palavra Aberta
Daniela Machado*

📸: Solen Feyissa|Unsplash

“Querido Papai Noel, fui muito obediente, educada e comportada. Queria muito uma boneca e mais de 210 mil seguidores no TikTok.” O pedido, feito por uma menina de 9 anos de idade, está na cartinha recolhida durante a ação de Natal de um shopping no Amazonas e atraiu a curiosidade de funcionários. 

Não que seja exatamente uma surpresa encontrar crianças e adolescentes que sonham em se tornar influenciadores digitais —qualquer pessoa que tenha perguntado por aí “O que você quer ser quando crescer?” já deve ter ouvido como resposta “Um youtuber famoso!”. Mas o pedido natalino inovou ao incluir um número detalhado de seguidores na casa das centenas de milhares. 

Há alguns anos, o universo de tiktokers, youtubers e outras personalidades das redes sociais desperta o interesse de jovens por todo o mundo, seja pela capacidade de atrair fãs, inspirar, ditar estilos de vida ou, em alguns casos mais emblemáticos, ganhar muito dinheiro. Há dados claros sobre esse poder de atração.

A pesquisa TIC Domicílios 2019 mostrou uma proporção elevada de crianças e adolescentes de 10 a 17 anos em práticas culturais online, com destaque para os que reportaram contato com vídeos de influenciadores digitais (55%), tutoriais (44%) e pessoas jogando videogames (41%). E, de maneira geral, o uso da internet cresce a cada ano: a presença online de jovens dessa mesma faixa etária passou de 79% em 2015 para 89% em 2019, alcançando 94% no ano passado, em meio à pandemia.

O que esses números mostram, de forma bem clara, é que de uma maneira ou outra as crianças e os adolescentes já fazem parte do mundo digital. Mas isso não significa necessariamente que tenham as habilidades essenciais para entender os desafios e as oportunidades, questionar sua presença online e atuar com responsabilidade e segurança nas redes. É bem possível que muitos sigam e curtam os influenciadores sem fazer as devidas reflexões.

Como em quase tudo na vida, há um lado muito interessante e poderoso dos influencers, mas também aqueles que não estão à altura do nosso like. 

No começo de 2021, num dos piores momentos da Covid-19, foi uma ação iniciada por influenciadores que mobilizou a sociedade e levou oxigênio aos hospitais de Manaus (AM). Houve ainda uma série de cientistas e médicos que se tornaram celebridades nas redes, traduzindo para a população informações complexas sobre a doença e medidas de prevenção. 

Por outro lado, é possível que você já tenha se deparado com influenciadores que, mesmo durante as fases mais agudas da pandemia, encheram as redes sociais com fotos de festas e muita ostentação. 

O melhor e o pior da internet estão a um clique do nosso alcance. No caso das crianças e dos adolescentes estamos cometendo uma enorme falha quando evitamos tratar desse e outros assuntos do universo digital.

Seja em casa, na escola ou em qualquer outro ambiente, não devemos perder a oportunidade de promover diálogo e reflexão sobre essas figuras que já fazem parte da nossa vida, com perguntas como “O que faz com que você queira seguir alguém nas redes sociais?”, “Já comprou algo só porque um influenciador recomendou?” ou “Você acha que um influencer deve avisar de maneira bem clara quando está recebendo dinheiro ou produtos para promover algo?”.

No caso das crianças que sonham em se tornar youtubers ou tiktokers famosos, um bom início de conversa é questionar que tipo de mensagem ou conteúdo elas gostariam de compartilhar, e mostrar exemplos de quem tem muito a dizer nas redes e outros de pessoas que simplesmente narram seu dia a dia. Com isso, os jovens poderão construir o entendimento de que, junto com grandes poderes (como o de influenciar milhares de pessoas), surgem grandes responsabilidades.

É o questionamento, a atitude crítica, e não a simples proibição, que fará com que os jovens amadureçam e possam colher o que de melhor a internet pode oferecer. Não adianta pedir para o Papai Noel —isso só a educação pode construir.

 

*Daniela Machado é coordenadora do EducaMídia, programa de educação midiática do Instituto Palavra Aberta

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