Liberdade de expressão é base para outros direitos fundamentais

Liberdade de expressão é base para outros direitos fundamentais 1024 598 Instituto Palavra Aberta
Patricia Blanco*

“Sem fatos, você não pode ter a verdade. Sem verdade, você não pode ter confiança. Sem confiança, não compartilhamos a realidade, não há democracia, e torna-se impossível lidar com os problemas existenciais do nosso mundo: clima, coronavírus, a batalha pela verdade.” É da jornalista filipina Maria Ressa, vencedora do Prêmio Nobel de 2021, a correlação que resume bem o tema do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa (WPFD, na sigla em inglês) deste ano, celebrado nesta quarta-feira (3) e lembrada pela diretora-geral da Unesco, Audrey Azoulay, no discurso de abertura da conferência realizada na sede da ONU, em Nova Iorque.

Sob o tema “Moldando um futuro de direitos: a liberdade de expressão como um motor para todos os outros direitos humanos”, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), que lidera as celebrações do WPFD – neste ano em seu 30º aniversário –, quer fomentar um necessário debate a respeito de uma perigosa equação.

Se é verdade que o direito à liberdade de expressão, consagrado no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, é o fiador dos demais direitos, também é verdade que a segurança dos jornalistas e o livre acesso à informação estão sob ameaça, o que pode desencadear um danoso efeito dominó.

Na prática, sem imprensa livre, destaca a UNESCO, ficam mais vulneráveis as causas ambientais, os direitos das mulheres, das crianças e indígenas, os direitos digitais, o combate à desinformação, a luta contra a corrupção e outros tantos. Diante dos desafios impostos atualmente à humanidade, também ficam ameaçados o respeito à diversidade e à pluralidade.

O fato é que a escalada de violência contra jornalistas e o aumento de campanhas de desmoralização da imprensa estão, infelizmente, bem consolidados. E não é uma situação apenas brasileira. Ocorre em diferentes regiões do planeta, a reboque de um processo de autocratização que, em 2022, chegou a um número recorde, segundo o mais recente relatório anual do instituto V-Dem, lançado em março.

O estudo registra que 42 países estavam nesse processo no final de 2022, incluindo o Brasil — no ano anterior, eram 33, conforme registrou esta Folha de S.Paulo. Muitos desses países têm grandes populações: juntos, abrigam 43% da população global. Em 1999, apenas 3% viviam em países com guinada uma ao autoritarismo, ainda segundo este jornal.

A comemoração dos 30 anos do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa coincide com outra data emblemática: o 75º aniversário da Declaração dos Direitos Humanos. É neste contexto que o debate em torno da liberdade de expressão como pilar de sustentação de outros direitos ganha força. Somente a partir da livre expressão, é possível construir uma sociedade democrática, que preserve a dignidade e autonomia do cidadão.

Nesse processo, há outra correspondência fundamental, destaca Marlova Jovchelovitch Noleto, diretora e representante da Unesco no Brasil, em entrevista exclusiva ao Instituto Palavra Aberta: sem educação midiática não há diálogo humano democrático. “Nesta atual era global – na qual a midiatização se tornou profunda e intensa, e a informação, contínua e crescente –, a fusão entre jornalismo e educação midiática é uma das melhores garantias para a manutenção da democracia”, diz Marlova.

Essa foi a mensagem de muitos participantes da conferência realizada na sede da ONU, em Nova Iorque, inclusive da diretora-geral da Unesco, Audrey Azoulay, que declarou que a preservação da liberdade de expressão e o respeito aos direitos humanos passa pelo empoderamento do cidadão, pela valorização da informação de qualidade e pela capacidade de saber diferenciar fato de ficção — competências desenvolvidas a partir da educação midiática e informacional.

No rol de alertas, ficou também a mensagem inspiradora da Agnès Callamard, secretária-geral da Anistia Internacional: “Neste cenário desafiador para a liberdade de expressão e de imprensa em que vivemos, precisamos resistir, reconstruir e reimaginar um futuro onde todos possam usufruir dos direitos fundamentais sem medo ou risco”. 

Que assim seja!

*Patricia Blanco é presidente do Instituto Palavra Aberta

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