Uso de mídias em sala de aula não é sinônimo de educação midiática

Uso de mídias em sala de aula não é sinônimo de educação midiática 730 487 Instituto Palavra Aberta
Bruno Ferreira*

📸: freepik

A maioria dos professores da educação básica brasileira, mais especificamente dos ensinos fundamental II e médio, já utiliza mídias no contexto das suas práticas pedagógicas. No entanto, poucos ainda o fazem com o objetivo de desenvolver habilidades críticas com relação à análise ou produção refletida de conteúdos midiáticos. 

Essa é uma das conclusões da pesquisa “Professores, mídias e informação: o repertório de docentes para a prática da educação midiática”, coordenada pelo Instituto Palavra Aberta e realizada em parceria com a Quantas, empresa especializada em estudos quantitativos e construção de métricas em áreas como educação e tecnologia. 

Com uma amostra de 310 professores das áreas de linguagens e ciências humanas, de todas as regiões do país, a pesquisa revela como professores relacionam-se com a informação: 74,5% deles sentem-se bem informados com relação a temas do seu interesse e áreas do conhecimento, mas apenas 30% deles julgam-se bem informados sobre temas mais distantes de sua área de atuação.

Outro dado que chama a atenção está relacionado à desinformação. Fake news é um tema de preocupação para 73% dos entrevistados, mas apenas 40% deles se sentem preparados para lidar com o desafio que elas representam na sociedade. 

Os educadores entrevistados demonstram que, assim como outros grupos sociais, situar-se criticamente no ecossistema informacional no qual estamos inseridos é uma tarefa árdua e que demanda formação. Por mais que haja currículos e diretrizes educacionais, como a própria BNCC, que destacam a demanda por educação midiática dos estudantes, é preciso garanti-la também entre adultos, os responsáveis por mediar a aprendizagem de crianças e adolescentes.

Essa dificuldade em lidar com desinformação e estar bem informado sobre temas para além da “bolha” reflete-se nos principais objetivos pedagógicos que esses professores estabelecem quando adotam mídias em sala de aula. Seu desejo, em sua maioria, é conectar os temas curriculares a acontecimentos atuais, algo mencionado por 97% dos entrevistados, ou alargar o entendimento de conceitos relacionados ao estudo das disciplinas, preocupação de 93% da amostra. 

Isso significa que o uso das mídias na sala de aula está mais subordinado ao aprendizado formal dos conteúdos curriculares e menos atento ao desenvolvimento de competências voltadas ao relacionamento dos estudantes com as mídias e com a informação.

Apesar de não ser pequeno o número de professores que usam mídias para incentivar os estudantes a manifestar livremente suas opiniões sobre um tema (91%) ou ainda produzir conteúdos informativos (90%) e identificar fake news e outras formas de desinformação (90%), essas habilidades ainda encontram-se na superfície dos objetivos da educação midiática, quando comparadas às metas estabelecidas por docentes que já possuem formação no tema. 

Para comparar repertórios midiáticos e informacionais e como estes se traduzem em práticas pedagógicas a partir das mídias, a pesquisa contou com uma segunda amostra: 125 professores egressos da formação em educação midiática do Programa EducaMídia. 

Estes, além de buscar nas mídias um complemento para a aprendizagem curricular, comprometem-se em com estratégias pedagógicas mais sofisticadas, que propõem a exploração de conteúdos de fontes, formatos e linguagens variadas (94%), o desenvolvimento de habilidades a partir de recursos digitais (92%), produção de conteúdo crítico (91%) e conhecimento acerca dos processos de produção das mídias (90%). 

Esses objetivos vão além do simples uso das mídias como material didático adicional e subordinado aos objetivos de aprendizagem dos tópicos curriculares, uma vez que buscam desenvolver criticidade e responsabilidade com relação aos conteúdos midiáticos que os estudantes produzem ou recebem. 

No entanto, para adotar as mídias na educação com essa intenção, mais professores devem ter garantido o direito de educar-se midiaticamente. Somente dessa forma, as mídias poderão ser reposicionadas no contexto da educação: de instrumento que facilita a aprendizagem a objeto transversal de estudo, indispensável à formação integral do cidadão do século 21

*Bruno Ferreira é assessor pedagógico do Instituto Palavra Aberta

 

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