Os desafios da Abert

Os desafios da Abert 150 150 Instituto Palavra Aberta

Daniel Slaviero, presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) para o biênio 2012-2014 – é a segunda vez, entre 2006 e 2010, que preside a entidade – e vice do Comitê Permanente de Liberdade de Expressão da Associação Internacional de Radiodifusão (AIR), entidade que representa 17 mil emissoras de rádio e televisão nas Américas, Ásia e Europa, concedeu entrevista para o livro ‘Conferência Legislativa sobre Liberdade de Expressão – 7 Anos de Debates’ e falou sobre diversos assuntos, como liberdade de imprensa e de expressão, integridade física de profissionais, legislação eleitoral e os desafios do seu setor.

IPA – Como o senhor avalia a importância da realização das Conferências Legislativas?

Daniel Slaviero – Não há democracia sem uma imprensa livre, vigilante e independente, com condições de fiscalizar as ações dos poderes públicos e de oferecer um serviço de qualidade à sociedade. Mas isso só acontece em um ambiente de liberdade de expressão e de imprensa. Por isso, debater esse tema, de tamanha relevância, com a participação de parlamentares, jornalistas, magistrados, governantes e organizações da sociedade civil, é uma inequívoca demonstração de maturidade. E não há melhor lugar para realizá-lo que o Congresso Nacional, por ser a casa que representa a diversidade da sociedade brasileira. A cada conferência, deixamos um saldo extremamente rico de reflexões e propostas que ganham dimensão real na vida dos brasileiros. O melhor exemplo é o da Lei de Acesso à Informação Pública, que foi tema central da conferência de 2006. No dia 16 de maio deste ano, a lei se tornou uma realidade. Nos três primeiros meses, os órgãos do Poder Executivo Federal receberam 25 mil solicitações de informação. Segundo a CGU, foram respondidas 90% delas.

IPA – A liberdade de imprensa e de expressão já é um valor absoluto na sociedade brasileira?

DS: Não há dúvida de que vivemos no Brasil uma democracia, aliás, o mais longo período ininterrupto de nossa história. A Constituição de 1988 foi um marco desta retomada, ao assegurar princípios basilares de liberdade de expressão e vedar qualquer forma de censura. Amadurecemos como sociedade, mas há ainda muito a fazer. Como advertiu Vargas Llosa, certa vez, apesar das garantias legais, infelizmente, nenhuma sociedade está livre de ideias autoritárias. Ele disse: “A luta pelo direito à liberdade de expressão deve ser entendida sempre como uma batalha que pode ser ganha, mas nunca como uma guerra. As liberdades de expressão, de crítica, de opinião, estarão sempre ameaçadas. Por isso, não devemos cair nunca na complacência.” No Brasil de hoje a maior preocupação vem do Poder Judiciário, especialmente, das decisões tomadas na primeira instância que impõem censura prévia aos veículos. No contexto latino-americano, não há dúvida de que o Brasil encontra-se em um patamar diferenciado. E, há que se destacar, a presidente Dilma Rousseff contribui muito para consolidar essa condição. Desde a sua primeira manifestação como presidente, defendeu a liberdade de expressão como um valor a ser preservado pela sociedade.

IPA – Ameaças à integridade física de profissionais de rádio e televisão têm crescido nos últimos anos? Esse é um problema que o setor enfrenta?

DS – Infelizmente, sim. Até julho de 2012, cinco jornalistas foram mortos pelo exercício profissional. Em uma década, somaram-se 22 crimes no Brasil. Os ataques ao trabalho da imprensa partem, em sua maioria, do narcotráfico e do crime organizado. O recrudescimento da violência nos preocupa muito, sobretudo, pela impunidade que caracteriza grande parte dos casos no Brasil e, de forma geral, na América Latina. A sociedade precisa reagir a esse tipo de crime, assim como as autoridades buscarem o esclarecimento e a punição dos responsáveis. A demora na investigação, denúncia e julgamento desses crimes se transformam em estímulos à repetição desses delitos.

IPA – A legislação eleitoral é hoje um desafio para as emissoras de rádio e televisão?

DS – Sim, a legislação eleitoral impõe importantes desafios às emissoras de rádio e televisão, visto que durante o período eleitoral sofrem uma série de restrições e, em razão de tais limitações, podem, diante de determinadas circunstâncias, encontrar severas dificuldades para informar à população, especialmente, quanto às questões eleitorais. Vale lembrar que em nosso País boa parte da população só tem acesso a informações através do rádio e da televisão, mas a legislação eleitoral impõe tantas restrições e prevê a aplicação de sanções tão severas que a cobertura do período eleitoral acaba prejudicada. Assim, acredito que a legislação poderia ser aperfeiçoada sim, eliminando certas amarras que, com o propósito de evitar desigualdades entre os candidatos, acabam cerceando o trabalho da imprensa.

IPA – As emissoras de rádio e televisão já estão preparadas para o mundo digital? Quais são os desafios que surgem para as emissoras com os gadgets eletrônicos, como iPads e celulares, e a própria Internet?

DS – A televisão avançou nos últimos cinco anos no processo de digitalização. Hoje, temos mais de 100 emissoras operando em alta definição e cerca de 90 milhões de pessoas atendidas em 480 municípios. A TV digital significa mais qualidade de imagem e som, e permite interatividade e mobilidade. O rádio aguarda a definição de seu padrão digital para este ano. Mas está sabendo se adaptar rapidamente à internet e aos novos dispositivos. Quase 97% das rádios têm acesso à rede, 80% possuem sites e a metade delas disponibiliza a transmissão ao vivo. Portanto, a internet, o acesso a novas mídias e os gadgets eletrônicos são, com certeza, aliados do rádio e da TV em seu desafio de se adaptar aos novos tempos e públicos, combinar o conteúdo a novos formatos e, principalmente, buscar modelos sustentáveis para o negócio.

IPA – Fale sobre autorregulação para a mídia? As emissoras de rádio e televisão estão buscando maiores canais de contato com os espectadores?

DS – A autorregulação é o caminho adotado nas sociedades democráticas modernas. No Brasil, muitas empresas de comunicação já têm seus códigos de conduta, princípios de atuação, suas regras de valores. No caso da TV e do rádio, qualquer deslize neste assunto provoca uma reação imediata do público. E é, justamente, em respeito a esse público que devemos sempre estar vigilantes.

 

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