O papel da família na educação midiática

O papel da família na educação midiática 1024 683 Instituto Palavra Aberta
Mariana Mandelli*

Imagem: Robo Wunderkind | Unsplash

Todo mundo que tem criança pequena na família ou conhece alguém que tenha já se surpreendeu ao vê-la desbloquear o celular dos pais, manusear aplicativos ou baixar joguinhos sem a ajuda de um adulto. A ideia de que as novas gerações já nascem sabendo lidar com as tecnologias, quaisquer que sejam elas, permeia uma espécie de imaginário coletivo contemporâneo, que se apropriou do conceito de nativos digitais sem perceber que ele camufla uma gama de riscos aos quais essas crianças e jovens estão expostos.

Desfazer o mito é relativamente simples: se adultos caem constantemente em todo tipo de golpe virtual, como ficamos sabendo frequentemente por conhecidos ou pela imprensa, o que nos faz pensar que crianças estão seguras diante desse e de outros perigos simplesmente por saberem apertar os botões certos? 

Confundir o fácil manuseio de celulares e outros dispositivos com o uso consciente deles é um dos grandes nós que precisam ser desatados para que a educação midiática, informacional e digital da população mais jovem se torne uma realidade. É preciso mostrar a ela o potencial incrível de criação, colaboração e aprendizagem das mídias, protegendo-a no ambiente virtual e não do ambiente virtual.

Essa tarefa deve ser compartilhada entre família e escola. Como diz um provérbio africano bastante popular, “é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança”. No que tange ao sistema de ensino, essa missão está posta pela ideia de que é nessa instituição que reside a formação cidadã dos alunos e alunas. E, num mundo conectado, a definição de cidadania está intimamente ligada a indivíduos que saibam ler, escrever e participar de modo ético, responsável e crítico dessa sociedade. 

No caso da família, há um problema que se assemelha ao desafio enfrentado pelos professores e demais profissionais da educação: como formar adultos para que eles possam formar crianças, se a maioria deles também não foi preparada para enfrentar a avalanche de informações, conteúdos, redes, plataformas e aplicativos que fazem parte hoje do nosso dia a dia?

Grande parte desses pais, mães, tios, tias, avôs, avós e demais responsáveis cresceram num mundo sem internet, tiveram uma infância offline e hoje são desafiados diariamente pelo contexto confuso e, muitas vezes, traiçoeiro que o ambiente digital oferece.

Por isso, o primeiro passo para que a família tenha um papel ativo nesse processo é justamente a consciência da necessidade de também se educar midiática e digitalmente para, então, apoiar filhos, sobrinhos e netos nesse aprendizado. Admitir essa ignorância em meio à desordem informacional é um ótimo começo. 

Temas como privacidade, segurança, compartilhamento de dados, controle parental e saúde digital devem ser estudados e explorados pelos adultos pois são fundamentais para que a família defina as suas próprias regras. Questões de cyberbullying, desafios virtuais, autoimagem, autoexposição e exploração infantil obviamente não podem ser excluídas, pois reúnem alguns dos maiores perigos online aos quais as crianças estão suscetíveis, com graves consequências para a socialização offline delas.

Isso porque, no mundo conectado, não existe mais a ideia de “entrar” e “sair” da internet, como muitos dos que são adultos vivenciaram anteriormente. Nossas experiências e relações de trabalho, afeto, consumo e cidadania hoje estão bastante relacionadas com a digitalização da comunicação, mesmo num contexto de tantas desigualdades sociais como o brasileiro. 

Portanto, é preciso se informar e pesquisar. Materiais excelentes sobre todos esses assuntos podem ser encontrados e baixados gratuitamente na SaferNet Brasil e no Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR, e também nas próprias plataformas digitais, como o Google e o YouTube Family Link, por exemplo.

Há uma máxima entre pesquisadores e entidades da área educacional com foco nas mídias e ferramentas digitais que questiona: se você não deixaria uma criança sozinha em um lugar público, por que a deixa sozinha na internet? Ter essa reflexão em mente é um caminho e um alerta para buscar conhecimento e informação com o objetivo de oferecer, a si mesmo e àqueles que estão sob sua responsabilidade, as melhores formas de modelar uma relação consciente e saudável com as tecnologias.

 

*Mariana Mandelli é coordenadora de comunicação do Instituto Palavra Aberta

 

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