Os nativos digitais também precisam de educação midiática

Os nativos digitais também precisam de educação midiática 1024 681 Instituto Palavra Aberta
Mariana Mandelli*

📸: freepik

A notícia de que a geração Z estaria usando o TikTok e o Instagram para fazer buscas na internet provocou um certo alvoroço em quem acompanha o mercado de tecnologia. Segundo Prabhakar Raghavan, vice-presidente sênior do Google, os jovens nascidos entre meados da década de 1990 e 2010 têm preferido pesquisar vídeos nessas redes sociais a acessar o buscador mais popular do mundo por meio de palavras-chave.

De acordo com Raghavan, dados internos do Google mostram que cerca de 40% desse público recorre aos aplicativos que mais usam para procurar informações e serviços, algo que pode não fazer sentido para as gerações anteriores e que ficou especialmente claro em uma frase do executivo: “Os novos usuários da internet não têm as expectativas e a mentalidade com a qual nos acostumamos”.

A Gen Z, ou “centennials”, é justamente a geração que nasceu num mundo conectado — aqueles e aquelas a quem nos acostumamos chamar de “nativos digitais”. Talvez seja realmente difícil entender o sucesso explosivo do TikTok entre quem passou dos 30 anos ou não utiliza o aplicativo em que o engajamento de vídeos curtos com as chamadas “trends” — tendências que se disseminam entre os usuários e usuárias — é altíssimo. Não à toa, Instagram e YouTube lançaram suas próprias “versões” da ferramenta com o Reels e o Shorts, respectivamente.

De qualquer forma, é preciso compreender com urgência e mais profundidade os usos que crianças e jovens têm feito desses aplicativos. Isto porque essas redes sociais, por mais que sejam vistas como “vídeos de dancinhas” por responsáveis, familiares e professores, têm alterado e modelado as formas pelas quais eles vêem, aprendem e se relacionam com o mundo. E se lembrarmos que 67% dos jovens brasileiros de 15 anos não sabem diferenciar um fato de uma opinião, dado recente da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), fica evidente que temos um problema.

Passou da hora de entendermos “nativos digitais” como um termo que corresponde apenas ao fato dessa geração ter sido criada em uma realidade com gadgets e internet disponíveis, o que não significa que elas saibam utilizá-los com responsabilidade, senso crítico e de maneira construtiva. Essas competências e habilidades precisam ser desenvolvidas — e a escola é o lugar para isso.

Ou seja, esse é um tema de interesse não só das big techs, que anseiam por criar novas formas de atrair e manter jovens em suas plataformas, mas de políticas públicas educacionais, que precisam abarcar a educação midiática para que esse público faça um uso qualificado de tecnologias que vieram para ficar.

Por mais que consigam criar, publicar e viralizar um vídeo com edição e sonorização em questão de minutos, os “centennials” não vão aprender sozinhos a analisar criticamente textos de mídia; a compreender os mecanismos de busca e curadoria; a fazer uso adequado de imagens, dados, textos e áudios; a entender os meios de produção e circulação de informações na grande mídia e em outros ambientes; entre outras questões relativas à produção de conhecimento na era da hiperconectividade.

A implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) deu legitimidade para que todos esses temas façam parte dos cotidianos escolares. Mas é preciso que o poder público, em todas as esferas, também se comprometa a criar iniciativas que preparem professores e professoras para isso.

Se o vídeo de curta duração está no centro dos modos com que os jovens lidam com a informação, é necessário mostrarmos a eles como fazer isso da melhor forma, compreendendo o básico sobre algoritmos, conteúdos patrocinados, jornalismo e, claro, desinformação. Não há, e não haverá, cidadania sem a compreensão desses conceitos.

*Mariana Mandelli é coordenadora de comunicação do Instituto Palavra Aberta

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